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Resenha: “Segredos da Tribo”

“Nós não queremos mais antropólogos aqui”.

A frase inicial do filme, dita por um índio ianomâmi, dá o tom do novo documentário de José Padilha, “Segredos da Tribo”, exibido no 15º É Tudo Verdade.

O filme retrata a atuação de antropólogos americanos e europeus junto aos índios ianomâmis estabelecidos na região da Amazônia venezuelana, entre as décadas de 1960 e 1970 e cujas pesquisas são sinônimo de pioneirismo e polêmica.

Entre os antropólogos destacados no longa estão o norte-americano Napoleon Chagnon, um dos pioneiros em realizar estudos de campo com os indígenas e autor da obra “Yanomamo – The Fierce People”, o francês Jacques Lizot, discípulo de Lévi-Strauss e um dos grandes nomes da antropologia na França, e Kenneth Good, que tornou-se célebre no mundo não–acadêmico pelo seu casamento com uma garota ianomâmi. Dos três citados, apenas Lizot se recusou a participar do filme.

O documentário foca menos nas contribuições científicas dos antropólogos e mais nas polêmicas de suas pesquisas. Chagnon, por exemplo, é acusado de genocídio, depois de inserir a vacina contra sarampo que dizimou mais de 200 indígenas. Já Lizot, segundo integrantes das tribos, teria praticado sexo com homens e crianças ianomâmis em troca de armas e outros “presentes”. Na análise dos acadêmicos, ele teria incentivado a prostituição em diversas tribos em troca de alimentos e outros gêneros.

A ruptura que as pesquisas de Chagnon, Lizot e cia., resultou no seio da comunidade acadêmica é explorada ao limite: imagens de acervo, muitas delas dos próprios cientistas em questão são contrapostas com depoimentos de seus desafetos, gerando uma acalorada discussão.

Para Padilha, Segredos da Tribo levanta questões relacionadas à filosofia da ciência: o papel do antropólogo e as metodologias aplicadas em suas pesquisas de campo (ou, no caso, a falta de metodologias claras) estão na base do debate e seriam algumas das  causas do descrédito acadêmico aos quais esses cientistas foram submetidos

Apesar do tom jornalístico adotado por Padilha, o documentário é denso e os debates acadêmicos podem cansar quem não está acostumado com temas científicos. Além disso, o velho jogo de poderes, tema recorrente na filmografia de Padilha (“Tropa de Elite” e “Garapa”, entre outros), está presente, só que desta vez num ambiente teoricamente “sério” e “respeitável” – a academia.

Resenha: “Uma Noite em 67”

Selecionado para abrir o 15º É Tudo Verdade, o documentário Uma Noite em 67, dos diretores iniciantes Renato Terra e Ricardo Calil, é uma divertida viagem à história da música e televisão brasileira. O filme retrata, através de imagens de arquivo, a final do 3º Festival da Música Popular Brasileira, em 1967, noite marcada pelo lançamento de algumas das mais importantes músicas e também por alguns micos televisivos.

Exibido pela TV Record, os Festivais eram responsáveis pelos maiores índices de audiência da época. Artistas consagrados como Chico Buarque, Caetano Veloso, Roberto Carlos e Edu Lobo eram habitués desse tipo de programa, onde apresentavam-se ao vivo para uma plateia eufórica e exigente.

Se a década de 1960 foi a era dos grandes festivais de música (numa proporção nunca mais alcançada, apesar das inúmeras tentativas em recuperar este formato de programa), o que fez de 1967 célebre? Canções como “Alegria, Alegria”, “Roda Viva”, “Domingo no Parque” e “Ponteio”, esta última interpretada por Edu Lobo e Marília Medalha – e música vencedora daquela edição – talvez possam responder essa pergunta. É pouco? Então, quem sabe dizer que em 1967 uma manifestação contra o uso da guitarra elétrica (demonizada como símbolo do imperialismo norte-americano), e que criou um racha na classe artística entre os favoráveis e os temerários ao instrumento, responda melhor? Ou seria ainda o momento ‘descontrol’  de Sérgio Ricardo, que, sob vaias e impedido de cantar “Beto Bom de Bola”, quebra seu violão e o atira contra a plateia? Independentemente da escolha, todas essas histórias estão lá, não apenas retratadas pelas imagens da época, mas também comentadas pelas pessoas que fizeram essa história acontecer.

O que mais chama a atenção em Uma Noite em 67 é o uso inteligente das imagens de arquivo – neste documentário elas não servem como meras ilustrações dos depoimentos, mas se prestam a dar o clima exato do que aquela noite representou para toda uma geração que, ao mesmo tempo em que vivenciava os anos de chumbo da ditadura militar, via surgir importantes manifestações culturais, a exemplo do Tropicalismo, ou ainda os primeiros passos do rock nacional, que deve muito de sua origem aos artistas “jovens e modernos” de 67.

Presentes na sessão de hoje (09/04), os diretores justificaram sua escolha por 67: “Aquela noite de 67 reuniu os artistas de que mais gostamos, de quem gostaríamos de desfrutar de alguma intimidade, fazer parte daquele universo de algum modo, enfim, eles são responsáveis pela trilha sonora de nossas vidas”,  resume Calil.

Ficou interessado em ver este documentário? A próxima sessão de Uma Noite em 67 em São Paulo está programada para dia 10/04, às 15hs, no Espaço Unibanco Augusta. A entrada é gratuita e recomendamos chegar ao cinema com mais de uma hora de antecedência (na sessão de hoje, dia 09, no mesmo Espaço Unibanco, a fila já dobrava a esquina por volta das 19h30).

Mais informações no site do É Tudo Verdade

É Tudo Verdade (ou quase)!

Começa hoje em São Paulo, com sessão exclusiva para convidados, o Festival Internacional de Documentários – É Tudo Verdade.

Dirigida pelo crítico Amir Labaki, a 15ª edição do evento exibirá, até o dia 18/04, 71 documentários originários de 27 países, entre os quais, 18 documentários brasileiros inéditos (entre curtas, médias e longas). Tudo isso gratuitamente e distribuído em 6 salas de cinema em São Paulo.

O documentário selecionado para abrir o Festival hoje, no Espaço Unibanco Augusta, às 20h30 é “Uma Noite em 67”, de Renato Terra e Ricardo Calil (crítico de cinema da Folha de São Paulo). O filme retrata, através de imagens de arquivo, a final do Festival da Canção da TV Record, momento memorável da televisão e música brasileira.

Na edição carioca do É Tudo Verdade, que começa oficialmente amanhã, quem abre é o polêmico “Segredos da Tribo”, de José Padilha. Sua obra é um olhar sobre antropólogos renomados, entre eles o americano Napoleon Chagnon e o francês  Jacques Lizot, que conviveram com índios ianomâmis na fronteira da Venezuela com o Brasil, entre as décadas de 1960 e 1970 e cuja fama acadêmica divide espaço com acusações de genocídio e pedofilia.

Sessões que prometem lotar são a de “Capitalismo – Uma História de Amor”, de Michael Moore. São dele os famosos “Tiros em Columbine”, de 2002, e “Fahrenheit 9/11”. Amado por muitos e odiado por outros tantos, Michael Moore foi alvo de inúmeras acusações, de cineastas e não-cineastas, que declararam que seus filmes não passam de manipulação e mentira. Não deixa de ser positivo, pois, o debate levantado a partir das obras de Moore, sobre a veracidade dos filmes documentários e sobre o papel do documentarista na produção deste gênero. A primeira sessão de “Capitalismo”, no É Tudo Verdade, está programada para o próximo sábado, dia 10, às 19h00 no Espaço Unibanco de Cinema, em SP.

Pôster de Capitalismo – Uma História de Amor, de Michael Moore, que terá sua prèmiére no É Tudo Verdade 2010

Dois cineastas serão homenageados nesta edição do festival: o francês Alain Cavalier, cujas obras compõem a mostra “Retratos/ Auto-Retratos”, dentro do programa Retrospectiva Internacional, e ainda, uma Homenagem Especial, em função do centenário do documentarista e fotógrafo Benedito Junqueira Duarte. São dele os primeiros filmes que registram as transformações de São Paulo, na primeira metade do século XX.

Cena de O Encontro, de Alain Cavalier (1996), que será exibido no Festival É Tudo Verdade 2010

Além da exibição de filmes, o É Tudo Verdade 2010 integra a 10ª Conferência Internacional do Documentário. Intitulada “Filme Vira Filme: o Documentário de Arquivo”, a conferência abrirá espaço para cineastas e pesquisadores discutirem a complexa questão do uso das imagens de arquivo, que, além de envolver os altos custos para utilização dessa fonte documental, esbarra na não localização ou desconhecimento do detentor dos direitos sobre as imagens. O evento acontecerá entre 14 e 16 de abril, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo e para participar é necessária inscrição préviaatravés do email inscrição@cinemateca.org.br.

Mais informações sobre a programação, cinemas participantes e inscrição para a 10ª Conferência Internacional de Documentário você encontra no site do É Tudo Verdade.

E para acompanhar o que está rolando no evento, de resenhas à novidades, você acompanha aqui, neste Le Champo!

À bientôt!

33ª Mostra – Crítica: “Os Famosos e Os Duendes da Morte”

Uma pacata cidade do interior. Um garoto de 16 anos e que, como qualquer adolescente, tem um forte sentimento de não-pertencimento ao local. Uma garota que partiu. Um misterioso que chega. Tudo muito folk embalado por “Mr.Tambourine Man”, de Bob Dylan.

Colocando as coisas dessa maneira parece fácil resumir “Os Famosos e os Duendes da Morte”, do jovem, porém talentoso cineasta, Esmir Filho. O longa franco-brasileiro, primeiro da carreira de Filho, foi selecionado para o Festival de Locarno (Suíça) deste ano e traz todos esses elementos para falar de algo mais profundo, embora comum à maioria das pessoas: inadequação e desejo de fuga.

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A história se passa numa cidadezinha alemã no Sul do Brasil, daquelas onde todo mundo conhece (e sabe da vida de) todo mundo e que não faz questão nenhuma de se relacionar com o que está além de suas fronteiras. Nessa esfera claustrofóbica, um garoto “que não tem nome” encontra na internet a redenção: a rede é sua ponte para o mundo exterior, muito mais interessante e cheio de possibilidades. É lá que ele conhece a “menina sem pernas”, com quem partilha sentimentos e a vontade de escapar. A cada um uma característica limitante – falta de nome ou pernas – e também um caminho.

Tudo no filme de Esmir Filho é onírico, abstrato, beira o confuso. Nada é direto, explícito, palpável, embora tudo seja muito intenso. Neste clima marcado por névoa e fumaça, real e virtual se confundem, bem como sentimentos e relações. Há mistério também, encarnado por uma misteriosa figura recém-chegada à cidade e que desperta a ira de uns e o interesse de outros.

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Por toda essa conjunção de elementos, falar de “Os Famosos e os Duendes da Morte” não é tão fácil quanto parece. Melhor é senti-lo. E ouvi-lo. Hey! Mr. Tambourine Man, play a song for me,
I’m not sleepy and there is no place I’m going to”…

Cinema Silencioso na Cinemateca Brasileira

Para aqueles que já conhecem e amam ou para os que tem curiosidade em conhecer as produções cinematográficas do chamado “período silencioso” (primeiras décadas do século XX): não percam a III Jornada Brasileira de Cinema Silencioso, de 7 a 16 de agosto, na Cinemateca Brasileira !

Além dos filmes silenciosos brasileiros, que têm seu espaço reservado a cada edição do evento, este ano a cinematografia silenciosa francesa ganhará destaque, em virtude do Ano da França no Brasil e das parcerias firmadas entre a nossa cinemateca com a Cinemateca Francesa, com os Arquivos Albert Kahn e ainda com os Arquivos Franceses do Filme/Centro Nacional de Cinematografia.

Na mostra francesa serão exibidas obras clássicas, como os primeiros trabalhos dos irmãos Lumière, os longas “O Homem do Mar” (1920) e  “Maldone” (1928), ambos de Marcel L’Herbier e Jean Grémillon e ainda a adaptação para o cinema do romance de Flaubert, “Salammbo” (1925), de Pierre Marodon. 

salammbo                                                   Salammbo, 1925

O filme “Études sur Paris” (“Estudos sobre Paris, 1928) de André Sauvage será exibido em sessões especiais na Sala São Paulo, de 13 a 16 de agosto, acompanhado pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, que tocarão partitura composta exclusivamente para este filme. As produções de Alice Guy, primeira diretora de cinema do mundo!, compõem um dos programas da Jornada, dedicado à coletânea da produtora Gaumont restaurada pela Cinemateca da Suécia.

Études sur Paris                                           Études dur Paris, 1928

Outro programa imperdível é o “Cinema do Povo e os Anarquistas do Cinema“, com filmes realizados pela cooperativa “Cinéma du Peuple – primeira organização anarquista ligada à produção cinematográfica para a divulgação de idéias libertárias entre a classe operária. Destaque para filmes como “La Terroriste” (“A Terrorista”), produzida pela Pathé em 1907 e “La Commune” (“A Comuna”, 1917), de Armand Guerra.

La Terroriste                                           La Terroriste, 1907   

A mostra intitulada “Em Busca do Brasil: a Amazônia Silenciosa” será dedicada aos filmes de expedição à Amazônia, feitos nas primeiras décadas do século XX e a seção “Janela para a América Latina ”  exibirá o maior sucesso do cinema silencioso chileno, a comédia “El Húsar de la muerte” (“O hússar da morte”, 1925) de Pedro Sienna.

El Húsar de la Muerte                                           El Húsar de la Muerte, 1925

Além da exibição de filmes, a III Jornada Brasileira de Cinema Silencioso será palco para três conferências proferidas por Isabelle Marinone, pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados do Collegium de Lyon e professora da Universidade Paris 3 – Sorbonne Nouvelle, que falará sobre as relações entre Anarquismo e cinema na França, tema de sua tese de doutorado, além da conferência inaugural do evento, a cargo de  Caroline Patte, pesquisadora do Centro Nacional de Cinematografia, que abordará o cinema silencioso francês conhecido e preservado até os dias de hoje.

 

Serviço: CINEMATECA BRASILEIRA 
                Largo Senador Raul Cardoso, 207 -prox. Metrô V.Mariana
                São Paulo – SP
                Informações: (11) 3512-6111 (ramal 215)

Ah, e o melhor, o evento é grátis! (somente para exibições na Cinemateca)

“Tetro” de Coppola abre hoje a Quinzena dos Realizadores

A clássica Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes tem início hoje com a exibição do aguardado “Tetro”, de Francis Ford Coppola.O filme foi rodado na Argentina e conta a história de um homem que viaja à Buenos Aires a procura do irmão mais velho e desaparecido há anos. No elenco estão o americano Vincent Gallo, além das espanholas Carmen Maura e Maribel Verdú.

Aqui, Coppola, vencedor da Palma de Ouro em 1979 por “Apocalipse Now”, com os atores de Tetro:

tetro_coppola_atores

 

A Quinzena é uma mostra paralela à Cannes e hoje se impõe como importante espaço destinado às produções e realizadores independentes do mundo inteiro. Entre os selecionados, destaque para a comédia “I LOve You Phillip Morris (EUA) de Glenn Ficarra e John Requa, estrelado por Jim Carey e com a participação de Rodrigo Santoro no elenco.

i-love-you-phillip-morris

 

Dentre os curta-metragens selecionados, um é brasileiro: Super Barroco, de Renata Pinheiro, trabalho este premiado na última edição do Festival de Brasília:

curtaSuperBarroco

Confira a lista completa dos longa-metragens presentes na 41ª Quinzena dos Realizadores de Cannes:

“Amreeka” de Cherien Dabis (EUA)
“Les Beaux gosses” de Riad Sattouf (França)
“Carcasses” de Denis Coté (Canadá)
“Daniel y Ana” de Michel Franco (México)
“Eastern Plays” de Kamen Kalev (Bulgaária)
“La Famille Wolberg” de Axelle Ropert (França)
“Go Get Some Rosemary” de Benny et Josh Safdie (EUA)
“De Helaasheid der dingen” de Felix Van Groeningen (Bélgica)
“Here” de Tzu-Nyen Ho (Cingapura)
“Humpday” de Lynn Shelton (EUA)
“I Love You Philip Morris” de Glenn Ficarra e John Requa (EUA) 
“J’ai tué ma mère” de Xavier Dolan (Canadá)
“Jal Aljido Motamyunseo” (Like You Know It All) de Hong Sangsoo (Coreia do Sul)
“Karaoke” de Chan Fui (Chris) Chong (Malásia)
“Navidad” de Sebastian Lelio (Chile)
“Ne change rien” de Pedro Costa (Portugal)
“Oxhide II” de Liu Jia Yin (China)
“La Pivellina” de Tizza Covi e Rainer Frimmel (Áustria)
“Polytechnique” de Denis Villeneuve (Canadá) 
“Le Roi de l’évasion” de Alain Guiraudie (França)
“La Terre de la folie” de Luc Moullet (França)
“Yuki & Nina” de Nobuhiro Suwa e Hippolyte Girardot (França/Japão)